Um dos mais importantes escritores chineses contemporâneos — e um dos mais ferrenhos críticos da censura em seu país —, Yan Lianke recorre à sátira para criar tramas inspiradas nas idiossincrasias de seus compatriotas. Após o sucesso de A serviço do povo, banido na China por achincalhar o regime de Mao Tsé-Tung, ele retorna com outro tema polêmico: a comercialização de sangue humano. Com base em três anos de pesquisa sobre o tráfico de sangue em sua província natal, Henan, O SONHO DA ALDEIA DING é uma elegante tour de force literária. Um livro que confirma o talento de Lianke e, ao mesmo tempo, se coloca como uma dura e concisa observação do subdesenvolvimento no interior da China. A partir de uma pequena vila, onde o sangue é comprado e vendido livremente, e com terríveis conseqüências, o autor cria um romance que ilustra como a busca por riquezas drena os recursos naturais e contamina a vida da população. A partir do pequeno Qiang, um inocente menino morto aos 8 anos, a história da vila da Aids é contata despretensiosamente. Na província de Henan, início dos anos 1990, habitantes de vilarejos pobres se veem seduzidos pela perspectiva de deixar a pobreza para trás. Tudo a um custo aparentemente baixo: a venda do próprio sangue. Logo doadores e coletores de plasma iniciam um ciclo desenfreado, sem se preocupar com o uso de agulhas esterilizadas. Desde a discórdia entre os moradores até o estabelecimento de uma ordem intrínseca ao vilarejo — e alienada ao governo — o menino, assassinado em decorrência do enriquecimento do pai com o esquema de coleta de sangue, expõe as falhas de caráter e as virtudes dos aldeões. Somos levados a questionar o que é certo e o que é errado dentro do caos provocado pelo próprio governo. A ética se inverte, e segundo uma moral própria os grupos de sobreviventes farão o possível para se proteger e garantir uma morte digna.