Malícia Negra, romance do consagrado escritor inglês Evelyn Waugh, ganha nova tradução pela Editora Globo, quarenta anos após sua primeira edição no Brasil. O livro. A época é a década de 1930 e o lugar, a ilha de Azânia, na África. Parece um paraíso em algum ponto da costa africana. Só parece. Pois imagine que nesse espaço convivem - pelo menos tentam - as mais diversas nacionalidades e etnias: negros, árabes, armênios, franceses, ingleses e indianos. Essa fauna de tipos e culturas - com direito a rituais de canibalismo, guerra civil e mosquitos infernais - transformou seu território num caos onde impera a corrupção e trapacear o próximo é uma das formas mais comuns de sobrevivência. Num belo dia, porém, a rotina é quebrada com a volta do imperador Seth, um jovem de 24 anos com hábitos bem diferentes dos de seu povo: bacharel em artes pela Universidade de Oxford, ele sonha em implantar no seu reino os costumes europeus. Logo descobre que não será uma tarefa fácil. "Chefe dos Chefes dos Sakuyu", "Senhor dos Wandas", "Tirano dos Mares", uma das primeiras medidas do imperador de Azânia consiste em anistiar e perdoar todos os súditos que recentemente se corromperam em sua lealdade. Há muito a fazer, no entanto. Seu país está dividido por dois séculos de conflitos entre os wandas e os árabes - que floresceram como comerciantes na costa e negociam com vários povos de todo o mundo. Massacres e assassinatos ocorrem freqüentemente e o tráfico de escravos ainda é uma prática comum. Coube ao avô de Seth, Amurath, filho de escravos, estabelecer a ilha como território independente e se auto-proclamar imperador. Essa é a trama do saboroso Malícia Negra, romance repleto de humor e fina ironia do consagrado escritor cômico inglês Evelyn Waugh, que a Editora Globo relança no Brasil, depois de exatos quarenta anos de sua primeira edição no país - que saiu em 1963 pela Civilização Brasileira, com o título Magia Negra. Com o requintado humor característico dos britânicos, a narrativa de Waugh é uma hilariante e implacável sátira ao comportamento humano, recheada de situações que trafegam entre o bizarro e mórbido - mas sempre risível. Ambição, submissão, escravidão, poder, traição, dominação, crimes, roubos. Tudo de ruim que marca os relacionamentos sociais e políticos serve de munição para Waugh destilar com elegância e narrativa fluente sua crítica à colonização européia na África, em contraste com a postura bárbara e mesquinha de muitos indivíduos originários de territórios africanos e regiões vizinhas. Evelyn Arthur St. John Waugh é considerado um dos mais queridos, respeitados e lidos escritores da Inglaterra de todos os tempos, embora não seja uma unanimidade quanto à sua postura longe da literatura. Principalmente por causa das idéias controversas e da ousadia em tomar posições polêmicas. Já no papel de escritor, foi apontado como responsável por ter livrado do formalismo o texto de humor de seu país. Com um estilo sutil de provocar a sociedade inglesa, Waugh foi considerado pelo crítico americano Edmund Wilson como "o único gênio cômico de primeira classe surgido na Inglaterra desde Bernard Shaw". O escritor conheceu a notoriedade muito cedo. Como jornalista, cobriu a guerra entre a Itália e a Etiópia entre 1935 e 1938 - experiência que lhe serviu de matéria-prima para escrever Furo!, a forma que encontrou para satirizar a imprensa de sua época. Durante a Segunda Guerra Mundial, teria sido o único sobrevivente entre os três tripulantes de um avião inglês abatido na Iugoslávia. Conta-se que, enquanto esperava o resgate escondido numa caverna, revisou as provas de um de seus mais conhecidos romances, Memórias de Brideshead. Como muitos artistas de seu tempo, Waugh viajou pelo mundo em busca de experiências e aventuras para escrever seus romances - que incluíram uma visita ao Acre, no norte brasileiro - e até uma breve passagem por Hollywood. Esta edição de Malícia Negra é ilustrada com dez desenhos do autor. Waugh o escreveu depois de passar um inverno nas Áfricas Oriental e Central. Uma primeira versão do romance foi publicada no Remote People. Como observou o próprio escritor, para compor o cenário da história ele fez uma mistura fantasiosa de diversos países e povos. Era natural, observou, que as pessoas imaginassem que ele se inspirara na Abissínia, naquele período a única monarquia nativa independente da África. Apesar de existir certas semelhanças entre Debra Dowa e a Adis Abeba de 1930, ele garantiu que jamais houve a mínima relação entre o personagem de Waugh e o imperador Haile Selassie. Os árabes também nunca existiram na costa etíope e o modelo estava mesmo em Zanzibar. Esta edição de Malícia Negra integra o projeto da Editora Globo de trazer ao leitor brasileiro os romances de Waugh com novas traduções e um diferenciado projeto gráfico. Neste ano foram lançados os volumes A Provação de Gilbert Pinfold e O Ente Querido.