Se em Guardados (2005) Sônia Marise falava lírica e amorosamente sobre a vida e sobre aqueles que lhe são caros, numa "poesia de quem ama e pensa", no dizer de Miguel Jorge, desta feita muda de gênero, mas conservando os temas. Estas narrativas, também guardadas por longo tempo, espelham a autora, direta ou indiretamente, na medida em que integram seu acervo humano de experiências de vida. Outros guardados não é um livro amargo, triste ou solene, ainda que seja denso de emoção. Nele, a autora revela memórias fragmentadas, retalhos da vida, não necessariamente só da sua ou dos seus, mas de outras pessoas, adultos ou crianças, às voltas com seus dramas, alegrias e tristezas. As narrativas de Sônia Marise, em sua diversidade, articulam-se como peças de um mosaico, formando um retrato, mesmo que impreciso, de um tempo. O seu próprio tempo de criança, o das crianças que a antecederam ou das que com ela viveram. Ela bem sabe que a história mais difícil de escrever é a própria, não raro complicada ou obscura, perversa ou inocente, às vezes mais dramática do que qualquer ficção. Ainda assim, dispõe-se a abrir seu baú de guardados, mostrando-nos um pouco de sua história, que tem matizes trágicos e cômicos, reais ou inventados, curiosos ou pitorescos. Nas epígrafes e nos temas, Outros guardados dialoga com o livro de poemas que o antecede, fazendo com ele uma espécie de contraponto. Ambos se alimentam da mesma fonte: o "seu muito real caso humano".