Com o relançamento de Um homem sem profissão, a Editora Globo inicia o projeto de recolocar no mercado, com novo e alentado tratamento crítico, a obra do escritor Oswald de Andrade. A escolha do título não é casual: Oswald publicou Um homem sem profissão pouco antes de morrer, em 1954, atendendo a um pedido do crítico Antonio Candido, que lhe aconselhara a escrever suas memórias. O escritor ouve o conselho e redige então o primeiro volume, que dá conta de sua infância, adolescência e primeiros anos de juventude e formação intelectual. Outros estavam planejados, mas a morte interrompeu o trabalho, que certamente acabaria se tornando peça chave para a compreensão da cultura e da política brasileiras da primeira metade do século XX. Dessa forma, Um homem sem profissão é o único volume de memórias de Oswald de Andrade figura central do Modernismo brasileiro que chegou ao público leitor. O livro cuida de reconstituir a história da família de Oswald, mas tem como foco principal a vida urbana que viria a transcorrer na cidade de São Paulo da belle époque, ou seja, os anos finais do século XIX e os agitados decênios entre 1900 e 1920. O livro acaba, assim, constituindo-se em um amplo painel da vida urbana daquela então pequenina São Paulo, o que interessará, além do público voltado para a literatura, os historiadores. São aventuras que se passam na rua Barão de Itapetininga, entre festas e saraus da alta classe, esticam-se na escola, e às vezes escapam às curtas viagens que o autor, um menino então, fazia com a família. Não passa em branco também a vida política da cidade, já que o pai de Oswald foi figura importante e ativa. Um pouco mais velho, vemos o escritor fazendo suas leituras preferidas (cujos nomes vão desde Castro Alves até Victor Hugo), lançando a revista Pirralho, iniciando uma movimentadíssima vida íntima e já participando da vida cultural brasileira. Cabe destacar o engraçado episódio em que Oswald testemunha e é quase atingido por uma bala de canhão a célebre Revolta da Armada, que explodiu justamente quando o autor passeava pela capital do Rio de Janeiro. No final do livro, já com a consciência nascente de seu papel de escritor, o texto passa a mostrar o convívio de Oswald com algumas figuras então tradicionais, como Coelho Neto e Olavo Bilac, e outras que com ele fariam história: Mário de Andrade aqui é personagem mais que coadjuvante. Um homem sem profissão, portanto, é um lançamento fundamental por mais de um motivo: repõe um texto central para a compreensão da obra de um dos autores mais importantes do nosso Modernismo, apresenta um momento especial na história da cidade de São Paulo e, lateralmente, do Brasil, esclarece questões ligadas à vida literária e, por fim, oferece ao público momentos de saborosa leitura.