Existem, felizmente, grandes escritores nunca por demais conhecidos. Felizmente, porque isto permite que, de tempos em tempos, tenhamos a grata surpresa de conhecê-los ou de recordá-los. É o caso do sérvio Ivo Ándritch, Prêmio Nobel de 1961 e um dos grandes autores europeus do século XX - que a editora Globo coloca, agora, ao alcance do público brasileiro, através da coletânea de contos Café Titanic. Com seleção, notas, prefácio, tradução direta do sérvio e glossário de Aleksandar Jovanovíc. Não tão felizmente, existem ao menos três Europas. A Ocidental, seu oposto geográfico e cultural, a Rússia ("Europa asiática") e a Europa Central. Esta, por estar no meio dos dois gigantes políticos e culturais, sofreu ao longo do tempo todos os impactos culturais e geopolíticos. Fato agravado pela presença, por séculos, de um terceiro gigante, o Império Otomano. O paradigma da condição histórica centro-européia é a região dos Bálcãs, zona de amortecimento e impacto entre Ocidente e Oriente, catolicismo e ortodoxia grega, cristianismo e islamismo, modernidade e tradicionalismo. Se isto gerou inúmeras batalhas, grandes tragédias, despotismos e exílios, também gerou certo tipo de homem europeu universal, cuja expressão atingiu seu ápice entre o fim do século XIX e início do XX. Três nomes bastam de exemplo: Kafka, Freud e Canetti. O sérvio-bósnio, iugoslavo, eslavo, europeu Ivo Ándritch (escritor, diplomata, poliglota) pertence a esse grupo. Conforme sintetiza o prefácio: "Não é por acaso que suas obras buscam representar, de forma constante, a variedade cultural e o contraste entre as várias civilizações. Num território que, ao longo dos séculos, experimentou centenas de tipos de dominação e violência, a visão humanista de Ándritch a respeito da variedade cultural, a avaliação positiva da diversidade, não deixa de ser uma grande lição - hoje e sempre.