Desde a estreia de Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, em 1943, o teatro brasileiro não sofria um impacto semelhante ao produzido pelas peças de Plínio Marcos. O teatrólogo santista lançava no palco, sem os filtros e convenções habituais, toda a brutalidade do bas-fond das cidades brasileiras. Assassinos, prostitutas, malandros e desajustados de todos os tipos viviam, diante dos olhos estatelados da plateia, situações de violência extrema e berravam em linguagem chula a sua angústia, a tortura da solidão, a miséria da decadência física, em tom de desafio, mas também na busca desesperada de um sentido para a vida.
“Será que somos gente?” pergunta a prostituta. Através da simplicidade desta pergunta transparece a gravidade e o pathos moral das indagações mais profundas da filosofia (Anatol Rosenfeld). A pergunta, com outras palavras, foi repetida ao longo de toda a obra do escritor. Sem resposta.
Plínio Marcos iniciou a sua carreira teatral em 1958, com Barrela, espetáculo representado uma única vez, depois de ter sido censurado e liberado, tendo por destino ser o maior sucesso de escândalo de nosso teatro em todos os tempos e imediatamente proibido durante 21 longos anos, informa Ilka Marinho Zanotto no prefácio do livro.
As peças seguintes (Dois Perdidos Numa Noite Suja, Navalha na Carne, O Abajur Lilás, Querô, para citar apenas as reunidas neste volume) foram encenadas, proibidas, perseguidas, louvadas, execradas, discutidas em nível moral, mas nunca ninguém duvidou de suas qualidades teatrais, a densidade dramática, a força lancinante dos diálogos.
Por sua autenticidade, as peças de Plínio não perdem nada quando lidas. Podem até ganhar alguma coisa, permitindo uma pausa para pensar ou amenizar o impacto de sua crueza, o que o turbilhão da encenação ao vivo não permite.