A obra que apresento, Ensino do Direito no Brasil: diretrizes curriculares e avaliação das condições de ensino, depois do prazer da leitura de seus originais, é fruto da experiência e criatividade de dois dos maiores especialistas brasileiros da área. Desde 1991, quando tive a oportunidade de participar intensamente da aventura e ventura de repensar a formação do profissional do direito, com a criação da Comissão de Ensino Jurídico do Conselho Federal da OAB, os professores Horácio Wanderlei Rodrigues e Eliane Botelho Junqueira foram sempre protagonistas qualificados e indispensáveis, pois reúnem produção intelectual de ponta e experiência prática, como docentes, pesquisadores, avaliadores e consultores. Nesta obra, suas reflexões e análises, ainda que se discorde de algumas, não são especulativas mas autorizadas pela observação e práticas constantes de tantos projetos pedagógicos que avaliaram ou ajudaram a construir, em várias regiões do país. Na primeira parte, o professor Horácio cuida das diretrizes curriculares, dando conta da evolução contextualizada dos vários modelos normativos dos cursos jurídicos brasileiros, desde sua fundação em 1827, dos limites e alcances das reformas curriculares e da concepção das diretrizes curriculares atuais. Identifica o núcleo obrigatório e o núcleo opcional dos cursos jurídicos, notadamente no trânsito das diretrizes da Portaria MEC n.º 1886/94 para as do Conselho Nacional de Educação, de 2002. Ressalta que "salutar inovação trazida aos currículos dos cursos de direito foram as atividades complementares", que ele procura definir os contornos, ao longo de sua exposição, especialmente na parte final. Concordo com o professor Horácio quando afirma que a reforma curricular, por si só, não resolve o problema da elevação da qualidade. Discordo, todavia, quando diz que muitos "embarcaram em uma utopia ingênua". Os primeiros documentos produzidos pela CEJ e pelos eventos por ela patrocinados em conjunto com outros protagonistas, reproduzidos pelo autor, demonstram a consciência que sempre se teve de as diretrizes constituírem ponto de partida, nunca de chegada. Do mesmo modo, não compartilho da crítica que faz à obrigatoriedade da monografia final e de acervo bibliográfico mínimo, no que é acompanhado pela professora Eliane. Sob aspecto formal, podem ter razão, mas essas exigências foram introduzidas conscientemente, como mecanismos de superação do modelo centenário de curso jurídico centrado em aulas prelecionais e lousa. Sem acervo bibliográfico mínimo, o curso jurídico é contrafação. Quanto à monografia final, os autores, coerentemente com o que sempre sustentaram, propugnam por um trabalho de conclusão de curso deixado a critério da instituição de ensino. Contudo, a experiência da monografia final tem revelado mais vantagens que desvantagens, sendo o marco culminante da formação do aluno sério, como valioso instrumento de aplicação da reflexão crítica, da criação, do desenvolvimento de habilidades de pesquisa, de raciocínio jurídico, de argumentação, de utilização da linguagem, de disciplina do trabalho intelectual, mediante o qual assume a posição de sujeito pleno da aprendizagem. Não me impressiona a atitude dos desonestos, pois são eles próprios os prejudicados. Conclui o professor Horácio com excelentes sugestões para composição do projeto pedagógico nos vários eixos de formação fundamental, profissional, prática e opcional. Após ressaltar os pontos positivos do Parecer n.º 146/2002 da CES/CNE (sob intensa reação da comunidade jurídica acadêmica e profissional, neste instante que escrevo), combate os pontos negativos, particularmente quanto a não contemplar as peculiaridades do conhecimento do direito, a falta das cargas horárias mínimas, a falta de clareza sobre as atividades complementares e o estágio, além das ambigüidades do texto. Sua preocupação é com "modelo educacional crítico, reflexivo, interativo e inovador". Com efeito, o grande desafio é a formação de um profissional com domínio de conteúdos e habilidades, mas, sobretudo, que seja criativo, ante a sociedade em mudanças, cuja tarefa nós docentes de direito não estamos suficientemente preparados. A professora Eliane dedicou-se não apenas a descrever as etapas do processo de avaliação das condições de ensino do direito, no Brasil, mas, sobremaneira, a promover o estudo analítico e crítico dos critérios e procedimentos que o INEP/MEC passou a adotar a partir do ano de 2002. Enfrenta a autora o risco da análise dos critérios e procedimentos, nesta fase incipiente, mas entende que a perplexidade por eles causadas está a merecer a análise contextual da avaliação. Poucos especialistas no Brasil detêm tanto cabedal de conhecimento e ânimo de crítica quanto ela, consistindo suas considerações a cada critério ou indicador preciosas contribuições. Enfatiza a preocupação com a expansão de vagas, divorciada dos padrões de qualidade, que a avaliação pode revelar. Para a autora, o período anterior da avaliação externa dos cursos jurídicos, especialmente no período 1997/98, consistiu em "um grande balão de ensaio". Atribui-me, com exagero, a qualidade de "grande artífice do primeiro instrumento de avaliação das condições de oferta", sendo necessário relembrar que sempre adverti para a necessidade de sua permanente atualização, para o que proponho que a comunidade acadêmica assuma papel de protagonista, reunindo-se periodicamente para debater os critérios de avaliação que devam prevalecer em cada momento histórico, ante as demandas sociais e as mudanças do perfil profissional, sem esperar por impulso das autoridades educacionais. Em suma, uma obra indispensável para os que encaram o ensino jurídico (que me perdoem os autores, que preferem "do direito") como espaço de realização da dignidade do processo pedagógico e da formação de profissionais que respondam às demandas da sociedade em transformação, com ética e qualidade.