Quem se volta contra a tradição acaba de um modo ou de outro se contaminando com o que dela há de pior, com a sua caricatura. E nesse complexo de Adão, os abusos formalistas, mais a crescente desfiguração da linguagem, com a posterior bênção acadêmica e sua formulação em decretos educacionais, criaram o isolamento do escritor que primeiro se ressentia de sua marginalização e depois a tornou numa ética - com licença da rima - de sua estética. Contra uma prosa que se pretende literatura porque se afasta do chão comum de cada dia é que se insurge, em continuação ao Muita retórica - Pouca literatura, Rodrigo Gurgel, que denunciou a cumplicidade da própria crítica literária nesse vício. Rodrigo Gurgel, diga-se, não escreveu esta obra com o intuito ranzinza de resgatar autores desconhecidos contra os escritores que se tornaram celebridades, o que seria outra forma de manifestar a sanha de originalidade dos modernistas, sob disfarce de arqueologia crítica. Está se falando, sim - pautado em princípios pedagógicos e de independência crítica, sem as comodidades ideológicas -, de ter curiosidade por saber o que foi produzido, de querer saber o que realmente diz o texto. - Jessé de Almeida Primo (Trechos do Prefácio, 'Literatura e verdade')