"Esse ofício de rabiscar sobre as coisas do tempo"; dessa forma Carlos Drummond de Andrade apresenta ao leitor o exercício de escrever crônicas. O conceito parece acolher com precisão os textos de Viver é meu vício, da escritora Domingas Alvim. No conjunto de crônicas que temos aqui, as coisas do tempo se confundem com as coisas da própria vida, matéria e razão da escrita. A cronista recolhe dos escombros, dos afetos, das lembranças e das vicissitudes a amálgama com que o texto é construído, apontando assim para a trêmula experiência do viver. Ela vai buscar, no tímido esticar de lábios, na espera de uma fila, no brincar da criança, na compra de um pastel, na recusa de um cobertor, o gesto primeiro da narrativa que se faz de palavras e também da substância viva do acontecimento. Há um inventário extenso de imagens poéticas que retratam não só as coisas do tempo, mas também um modo de existir. (...) E é dessa matéria contrastante de que é feita a vida, a escrita que seguramos em nossas mãos. "No bosque da leitura, as árvores que dão fruto são as do afeto", o leitor é assim convidado a adentrar essa paisagem ancorada na afetividade, na entrega generosa do texto e de si. O livro nos coloca, enfim, de frente para esse rabiscar sobre o viver, "o mais árduo dos vícios a se largar".