Os discursos criam materialidades arriscadas, abrem jogos indeterminados cujos efeitos são desconhecidos pelo seu enunciador. A parresía é uma aposta nesse jogo enquanto uma ética da coragem, ética do dizer a verdade perante si e aos outros. O delírio, na implacável materialidade do louco, é onde habitam todos os possíveis, habitam todos os escândalos da verdade e da razão. O louco é a materialidade social e histórica daquilo que escapa dos padrões racionais pelo escândalo do verdadeiramente outro, assim como é o cínico parresiasta que afirma a verdade de sua existência como ruptura das convenções sociais de seu tempo. Produzir um discurso é sempre uma atitude arriscada, porque arrisca na exposição da verdade a integridade do sujeito que fala, a integridade de suas relações, a integridade de sua realidade. O louco enquanto um cínico parresiasta é o escândalo da verdade materializada e representa as margens de uma cultura que pretendeu superar-se na razão, mas que deixou fora de seu projeto a alteridade da loucura como forma de uma diferença radical. A relação com a alteridade é fundamental como condição de possibilidade da noção política de parresía no sentido da esfera pública do discurso, como também é fundamental para a relação ética que se estabelece entre os personagens de um processo de subjetivação dialógico. Os paralelos e semelhanças entre a loucura e a parresía realocam o louco dentro de um contexto discursivo onde a sua particular forma de verdade seja de fato efetivada como discurso crítico.