A dramática trajetória pessoal do pensador italiano Antonio Gramsci rivaliza em interesse com sua própria obra. O jovem militante foi encarcerado em 1926 pelo regime ditatorial de Benito Mussolini, para ser posto em liberdade apenas em 1937, com a saúde já fragilizada, em um golpe político do Duce apenas para que ele não morresse, aos 46 anos, em uma prisão fascista. Em seu isolamento, o prisioneiro conseguiu, então, estabelecer uma rede de comunicação não apenas com o restrito mundo consentido pelas duras leis penais, mas principalmente com interlocutores virtuais e gerações futuras, levando-o a apostar em um diálogo für ewig com aqueles que como ele no mundo todo buscam caminhos corajosos para romper com o capitalismo e a dominação. Deste diálogo imaginado e indeferido entregue nas geniais notas dos Cadernos, derivou o que mais tarde se revelaria uma assombrosa análise crítica do mundo contemporâneo nas suas mais complexas e contraditórias facetas. Uma das singularidades de Gramsci é o fato de ele ter escapado ileso da derrocada do comunismo que fracassou. Suas análises sobre as metamorfoses mais modernas do capitalismo, assim como dos fenômenos mais recorrentes na história contemporânea, continuam sendo utilizadas nas mais diversas trincheiras, às vezes até com perigosas distorções. Alguns dos temas centrais do pensamento de Gramsci são resgatados de forma original e ousada por Giorgio Baratta neste primoroso livro. O leitor encontrará aqui uma discussão pontual dos conceitos mais polêmicos em Antonio Gramsci, como Americanismo, produção, cultura, nacional-popular, hegemonia, dialética, e tantos conceitos clássicos do marxismo repensados e recriados por uma inteligência penetrante e uma original metodologia de filologia vivente que ultrapassam o seu tempo e o seu país e chegam até nós com a densidade e a atualidade das complexas questões que se escondem por trás dos conflitos Norte-Sul, da globalização, do internacionalismo, dos novos caminhos de libertação empreendidos pelos povos subjugados. Baratta discorre com pleno domínio sobre o conjunto da obra de Gramsci, estabelecendo um pertinente contraponto com as problemáticas maiores do mundo atual e com o que se convencionou chamar de pós-fordismo e pós-moderno, fazendo com que os escritos de Gramsci venham a dialogar com diversos autores contemporâneos, como Stuart Hall, Edward Said, Etienne Balibar e Carlos Nelson Coutinho. Desta maneira, o autor resgata em Gramsci todo o seu frescor e toda a sua vitalidade, que o levaram a atravessar o século XX e a continuar atual em um mundo que muda a todo momento.