Ronie aprendeu a dançar com a literatura. Má professora, ensina o que não devemos dizer. Para a dança contemporânea, se você fala demais, corre o risco de perder a língua, assim como o rapaz da cena final do filme Salò, de Pasolini. Ronie não perdeu a língua; perdeu o emprego, a casa, o sucesso assim como os poucos que movimentam o universo das artes, um risco ao entretenimento. Virou morador de rua, e o verbo virar não representa uma condição: foi Ronie quem decidiu ir para a rua. (Segure seu sorriso enviesado, ele só faz sentido para você). Ronie passeia de um bairro a outro, de uma cidade a outra, de um continente a outro, sozinho. Quem quer fazer companhia para um vagabundo? Em seu corpo agregam-se a sujeira, as bactérias, a visão. Ele vê o que muitos veem e, em voz alta, diz o que muitos não podem dizer porque têm uma abelha no chapéu ou óleo escondido sob a axila, foram apanhados em flagrante delito, e agora pagam por isto; a liberdade deles está por um fio, estão dispostos (...)