A trombeta envergonhada reúne seis contos de tamanhos diferentes de Haim Nahman Bialik, um dos mais tradicionais poetas e narradores de língua hebraica. Ainda que tenha entrado para a história por causa de sua poesia, Bialik é também um exímio narrador. As histórias normalmente se passam no interior de pequenas comunidades judaicas, às vezes uma família, outras um bairro ou uma cidadezinha. Feriados, rituais religiosos e costumes judaicos, descritos com precisão pelo autor, misturam-se a tramas de desterro, opressão econômica e violência em textos cheios de ironia. Como é tradicional na cultura judaica, os contos de Bialik simulam uma espécie de ambiente oral, em que uma pessoa conta um tipo de "caso" especial para outra, ou para um grupo de ouvintes, que tirará da narrativa algum tipo de moral ou conselho, ou ao menos terá algum tempo de distração. Como elo entre as histórias, o respeito pela religião e pelas tradições, muitas vezes repetidas em situações bastante delicadas. No conto que dá título ao livro, por exemplo, uma família aguarda o retorno do filho, que voltaria para uma visita durante o serviço militar. Como atrativo, o rapaz anuncia que iria trazer, na bagagem, um instrumento musical com que divertiria seus parentes e a família da noiva. Horas antes de sua chegada, porém, problemas de especulação imobiliária fazem com que seus pais e irmãos sejam despejados e se coloquem na estrada, sem ter exatamente para onde ir. Cheia de vergonha por causa da situação, a trombeta acaba não saindo das malas. Sem dúvida, muitos dos contos ilustram a situação do povo judeu, que antes da criação do Estado de Israel (Bialik morreu em 1934, portanto sem uma pátria definitiva) viveu inúmeros e traumáticos deslocamentos. No entanto, mesmo quando descreve situações de opressão e violência, Bialik impõe alguns momentos cheios de humor, normalmente a partir de jogos de linguagem, ironia e alguma irreverência na discussão dos costumes. Em outras situações, a linguagem de Bialik torna-se lírica, quase chegando a constituir passagens de prosa poética, caso do final do conto descrito acima. Cheio de humor, por sua vez, é o conto "Ariê, o brutamontes", por exemplo, em que um velho gigantesco e pão-duro, cujo principal passatempo é arranjar "pacotes" de dinheiro, se envolve em diversas situações hilárias por causa de uma sovinice doentia até se ver no meio de uma verdadeira pancadaria entre famílias. Como pano de fundo, o conflito entre o progresso - que diversifica as possibilidades para quem deseja investir seu dinheiro - e uma mentalidade muito presa à tradição, caso da do brutamontes Ariê, que se recusava a deixar qualquer dinheiro em um banco e muito menos comprar uma carta de investimento. Junto com as seis histórias, o livro conta ainda com um prefácio de Berta Waldman, professora da língua e literatura hebraica da Universidade de São Paulo. Além de discutir a obra de Haim Nahman Bialik, Waldman faz um breve resumo da literatura hebraica antes da formação do Estado de Israel e esclarece os costumes tradicionais apresentados no livro.