De 1933 a 1936, os Estados Unidos testemunharam uma guerra dentro de seu próprio território. Num país cujas instituições viviam uma crise de credibilidade sem precedentes, quadrilhas de assaltantes se tornavam celebridades nacionais da noite para o dia - até porque tinham entre suas vítimas preferenciais os bancos, que em tempos de depressão econômica gozavam de prestígio zero junto à população. Roubando dos ricos e impondo humilhações em série para várias polícias estaduais, criminosos como John Dillinger e Bonnie e Clyde cresciam em popularidade a cada golpe, tiroteio ou fuga espetacularmente explorados pela imprensa. A reação do Estado veio na forma da chamada Guerra ao Crime, que viria a ser igualmente espetacularizada pela mídia da época. Classificada por alguns historiadores como uma campanha de fins propagandísticos, a iniciativa do governo concentrou a tarefa de tirar de circulação os criminosos-celebridades sob um único órgão federal - e com carta branca para seu diretor, John Edgar Hoover, usar de todos os métodos que considerasse necessários. Surgia assim a mitologia do Federal Bureau of Investigation, o FBI. Idealizado como a mais completa reportagem sobre a ascensão e a queda de seis lendárias facções criminosas dos anos 1930 - as de Dillinger, Baby Face Nelson, Pretty Boy Floyd, a quadrilha Barker-Karpis, Machine Gun Kelly e Bonnie e Clyde -, Inimigos Públicos é o livro que deu origem ao filme homônimo dirigido por Michael Mann, lançado no Brasil em julho e com os astros Johnny Depp e Christian Bale no elenco. O confronto entre o gângster Dillinger (Depp) e o agente federal Melvin Purvis (Bale) foi o foco da adaptação cinematográfica, mas corresponde a uma fração do amplo retrato traçado em cores vívidas pelo autor do livro, Bryan Burrough, jornalista que atua como correspondente da revista Vanity Fair. Inimigos Públicos, o livro, bebe em fonte de informação privilegiada: os arquivos do próprio FBI, cujos documentos acerca da Guerra ao Crime foram abertos para consulta pública no fim dos anos 1980. É de onde Bryan Burrough garimpou informações inéditas que iluminam não só a trajetória das quadrilhas, mas sobretudo a gênese do próprio FBI. O legado daquele período sobrevive até hoje no conceito de que a lei e a ordem, nos Estados Unidos, são responsabilidade direta do governo federal. Nas palavras do autor, Inimigos Públicos é um relato tão fiel quanto possível de "como o FBI transformou-se no FBI".