Os contos de Elias José, em 'Fantasia do olhar', tentam se aproximar dos quadros de Aldemir Martins, propondo ao leitor um jogo e diálogo entre texto e imagem. As duas linguagens formam uma rede, que se completa com a interpretação pessoal do leitor. São dois textos dependentes e, ao mesmo tempo, independentes no contexto do livro. O escritor cria cenas, personagens e lugares que permitem ao leitor visualizar também a narrativa do que a imagem mostra. O mundo real se mistura com a matéria do sonho e da poesia. Elias José, em seus delicados contos, nos convida a penetrar no universo lúdico e muito brasileiro do consagrado pintor cearense Aldemir Martins, que conseguiu, em seu trabalho, unir a inovação e a pesquisa formal do modernismo a temas e motivos caros à cultura popular nordestina. As obras do pintor escolhidas por Elias José para serem reinventadas por meio da literatura debruçam-se, em especial, sobre um dos temas mais recorrentes na obra de Aldemir Martins: as pinturas que retratam a fauna do país, nas quais gatos, galos, pássaros e peixes ganham vida a partir de traços delicados, porém precisos, e de cores vibrantes. Embora as narrativas sobre animais predominem, há exceções, como os dois contos que se debruçam de maneira inusitada sobre uma das figuras mais características do imaginário nacional: o cangaceiro. Os minicontos de Elias José preservam o caráter lúdico e a leveza da obra do pintor, apropriando-se dela de maneira bastante livre e despretensiosa -- sem inserir na narrativa contornos por demais definidos que pudessem tolher a imaginação do leitor em sua aproximação das imagens. O elemento do humor e da brincadeira encontra-se quase sempre presente, até mesmo nas narrativas mais líricas.