Resgatando elementos de diversos campos do saber - filosofia, literatura, artes plásticas - Olgária Matos, em 'Discretas esperanças' vem explicitar uma inter-relação peculiar entre política e cultura. Em tempos de instituições democráticas corrompidas e de perda de referenciais humanísticos, essa importante obra discorre sobre questões essenciais da contemporaneidade. Reunida sob forma de ensaios, interligados pela busca da compreensão dos processos inerentes ao mundo contemporâneo, a obra é intensamente fecunda na medida em que retoma a tradição do pensamento filosófico para subsidiar essa tarefa. A autora revisita de Sócrates a Foucault, detendo-se mais demoradamente nos filósofos da Escola de Frankfurt, já que é uma importante intérprete das idéias dessa escola no Brasil. È latente na obra um trajeto explicitando como, com o advento da modernidade, a preocupação com a natureza e com o bem viver foram diminuindo à proporção em que o progresso técnico foi se intensificando. Pode-se ver isso no ensaio "Ciência da natureza desencantada ao reencantamento do mundo", no qual Olgária Matos utiliza o mundo grego como espelho para oferecer a imagem do contemporâneo; completamente dominado por uma ciência estritamente técnica que não reflete sobre si mesma, sobre o seu papel na sociedade. Impregnada desse espírito acrítico, a mídia se impõe, tornando homogêneos pensamentos e sentimentos. A indústria cultural conduz o indivíduo a preferências intelectuais parcas de significado humanista, em dívida com reflexões mais sofisticadas acerca de seu contexto social. Como poderia o indivíduo pensar criticamente, em meio a aceleradas e rasas informações midiáticas, a própria política, a qual se encontra em ampla crise ética? Dessa forma, dogmatismos são incentivados e aprofundados e a razão, que seria portadora das medidas tanto na vida privada, como na pública, não mais se reveste da capacidade de deliberar e agir em busca da paz e do bem-estar. Trata-se de uma busca constante por uma sociedade que se alicerce nos laços da amizade, da fraternidade e da compaixão; por homens que se destituam do desejo de dominação e renunciem a se relacionar com a natureza como mero objeto; é, sobretudo, a tentativa de contemplar a questão "Que tipo de civilização queremos?"