Manuel Bandeira escrevia com miraculosa simplicidade, com um despojamento franciscano. O santo de Assis se desfez de todos os bens – e em certa ocasião até das vestes – para alcançar aquela simplicidade que combina com a perfeição. Bandeira, espírito franciscano, despojou sua poesia e prosa de todos as bijuterias de estilo, dos adjetivos balofos, das metáforas inúteis. Escrevia com frases secas e diretas, na linguagem de todo mundo e de todo o dia. Poeta por vocação, a crônica foi uma espécie de bate-papo com amigos, como ele mesmo a definiu, traduzindo as impressões, irritações e estímulos nascidos do cotidiano e anotados com encanto ou desencanto, numa atenta e risonha reverência à vida. Se o fundo de seu pensamento era austero, como observou Carlos Drummond de Andrade, essa austeridade era amenizada por um leve sorriso, sorriso dentuço, que talvez fosse o supremo refinamento da ironia. Como bom cronista, tudo lhe servia de tema, as suas andanças pelo Brasil – Ouro Preto, Bahia, Recife – aspectos de viagem, os pardais, pardais pássaros e pardais literários, o queijo de Minas enviado por um poeta, o livro recém-lançado, a morte de amigos, a sedução das grandes personalidades, se chamassem elas Lenine ou Carlitos. Sob o cronista havia também um crítico sagaz de arte, apreciando com comoção, mas sempre com discernimento, a escultura de um Aleijadinho, as velhas igrejas brasileiras, a arquitetura das cidades adormecidas. Em tudo isso palpitava um grande e sentido sentimento brasileiro e não raramente boas doses de poesia. Às vezes, em vez da crônica esperada, brindava os leitores com um conto. Neste caso está o delicioso “O Professor de Grego”, que mais do que uma história soa como uma metáfora da própria sociedade brasileira. O cronista era mestre em surpresas e sutilezas.