A poesia iconoclasta de Douglas Laurindo não propõe, simplesmente, a destruição das imagens sagradas da nossa cultura machista e heteronormativa. Sua operação é a da devoração criadora, com ressonâncias do sonho de Oswald de Andrade. Trata-se, porém, de uma antropofagia particular: devorar o interdito, o proibido, a normatividade e, nesse ato, devorar a si mesmo para recriar-se livre e potente, mesmo na interdição, entre as fendas: e como eu caminhasse/por aqueles pátios líquidos/de violência falada,/algo inesperado se via://a fenda é o espaço/estreito no qual o fio/morte e vida termina. O desejo nasce nas fendas dos becos urbanos, do corpo e manifesta-se despudoradamente na linguagem: varas que latejam à procura de preencher os buracos abertos pelos processos de subjetivação colonizadora de nossos corpos e mentes. Como Adília Lopes, Laurindo está ciente de que esse uso da linguagem constitui um jogo bastante perigoso e sabe também que é o único jogo possível, numa sociedade(...)