Atingir as massas com arte genuinamente brasileira e engajada. Esse era, resumidamente, o principal objetivo do Centro Popular de Cultura da UNE. Criado num momento em que as diversas manifestações artísticas no país pareciam alimentar-se mais das vanguardas européias do que da realidade brasileira, o CPC tornou-se laboratório de valorização da cultura nacional-popular, com todos os dilemas e dificuldades que o projeto acarretava. Reunindo um amplo conjunto de fontes da época, Miliandre Garcia resgata a experiência militante do CPC com equilíbrio crítico, analisando a gênese dos projetos culturais da esquerda estudantil, assim como os debates internos do CPC e a trajetória peculiar do combativo Carlos Lyra, situada num meio termo entre o conteúdo nacionalista e a forma algo cosmopolita da bossa nova. Versão modificada de uma dissertação de mestrado, o esclarecedor estudo de Miliandre Garcia trata também da experiência do Teatro de Arena, criticado em parte por não atingir o grande público, mas que foi fundamental ao inspirar a fundação do primeiro CPC, em 1961, no Rio de Janeiro. Importante também é o trecho em que Miliandre retrata a aproximação de artistas, intelectuais e estudantes do CPC com as classes populares, cujo exemplo mais marcante talvez tenha sido a inauguracão do restaurante de Dona Zica e Cartola, que reunia compositores "da elite" como Vinicius de Morais e Carlos Lyra, com sambistas "do morro" como Zé Kéti e o próprio Cartola. A inovadora experiência do CPC só foi interrompida com o golpe militar de 1964, que jogou o país nas trevas da ditadura e teve como uma de suas primeiras conseqüências o incêndio da sede da UNE e a decretação de sua ilegalidade.