FICHAS DE VITROLA & OUTROS CONTOS deixa bem clara as intenções de Jaime Prado Gouvêa ao reunir, depois de 16 anos sem publicar, as canções, quer dizer, os melhores contos (18 dos 42 textos publicados, além de três inéditos) de sua premiada e criteriosa carreira. “Depois, alguns fatos, mortes de pais, necessidade de dar outros rumos à vida e a sensação de que se escreve demais e se lê muito pouco neste país, tudo isso aliado a uma doce aposentadoria e a uma desavergonhada preguiça, me fizeram relaxar até descobrir, meio assustado, que passei do início às ‘obras completas’ antes da hora. Mas, agora, com o passado republicado e passado a limpo, talvez seja a hora de recomeçar. Pesou também a necessidade de não me repetir e o medo de piorar (que faria bem a muita gente...)”, explica o autor, com apenas quatro títulos lançados desde sua estréia em 1970. A metáfora sobre a literatura de Jaime Prado Gouvêa pode ser percebida num dos melhores textos do livro, chamado “Vocês ainda não viram nada”. No conto, um homem consome anos para construir dentro de seu apartamento uma ferrovia perfeita, com trilhos de vinte metros de comprimento, cálculo de ângulos das curvas, miniaturas de pessoas, carros e placas de trânsito. De posse de todo o cenário, este homem decide pôr todo este mundo em movimento, alternando velocidades estonteantes com passeios de turistas, pequenos e grandes acidentes, sustos e belezas a serem vistas da janela da cabine tomando um chocolate quente – ou ouvindo música.