De onde surge o amor? O que transforma um sentimento de simpatia numa paixão avassaladora? O que acontece com quem é presa de tal fenômeno? E qual o papel do ciúme? Partindo de tais questionamentos e de sua própria história pessoal (mais especificamente uma desilusão amorosa), Stendhal (1783-1842) escreveu, em 1820, Do amor, a um só tempo uma fisiologia da paixão e uma confissão íntima. Dois anos depois seria publicado o livro, contendo a idéia que se tornaria célebre da "cristalização amorosa": a pessoa apaixonada cristaliza-se, isto é, fica paralisa­da, perde a habilidade de agir e raciocinar, sobretudo em presença do ser amado. Em 1818, Stendhal, que vivia então em Milão, havia sido apresenta­do a Matilde Dembowski, beldade lombarda casada com um oficial do exército polonês. Matilde, que era conhecida como uma mulher virtuosa e de fibra, não perdoou o escritor quando este, apaixonado, seguiu-lhe numa viagem ao interior da Itália, comprometendo sua reputação. O rompimento deixou Stendhal arrasado. Por isso Matilde, embora nem sempre nomeada, faz-se sentir inúmeras vezes em Do amor e das diversas fases dessa doença (como o próprio autor chamou o livro certa vez). Também nesta obra, apesar de romântico, Stendhal mostra-se um precursor do feminismo, ao abordar as relações espinhosas entre sexo, moral e religião.