Numa época não muito distante, antes de se tornar comum o emprego do termo nerd, falava-se que fulano ou beltrano, por usar óculos, era um Cego Aderaldo. Mas onde estaria a origem de tal expressão? É, não só com o intuito de elucidar seu passado, que por ora é publicado este livro do selo Escrituras, cuja autoria é de Cláudio Portella, escritor, poeta, crítico literário e jornalista cultural. Na verdade, faz-se por bem mais que isso, numa homenagem ao grande Aderaldo Ferreira de Araújo, versador e cantador, figura fascinante de nosso cordel e, por extensão, de nossa cultura popular nacional. Aqui o leitor encontrará um pouco de sua história, marcada pela superação das limitações físicas, e sua obra de ricos achados orais, glosas e motes, desafios e quadrões, que foi objeto de estudo para grandes pesquisadores, caso de Luís da Câmara Cascudo, Edson Carneiro, Leonardo Mota, Alceu Maynar de Araújo, entre outros. Com o avançar das páginas, se poderá fazer um aprofundamento na trajetória de Cego Aderaldo, desde sua infância árida na cidade do Crato, Ceará, passando por episódios-chave, a exemplo de sua primeira peleja de versos; a que foi travada, posteriormente, com Zé Pretinho do Tucum; seu encontro com as ilustres figuras de padre Cícero, padre Antônio Vieira e Lampião; sua enriquecedora experiência no contato com tecnologias da época, como o gramofone e o projetor de cinema; os versos que compôs a fim de vender o licor depurativo de sangue Tayuyá, o sabão Aristolino, os xaropes Grindélia e Agriodol; tudo isso mergulhado num universo de violas e cantorias. Em definitivo, Cego Aderaldo é um exemplo de força de vontade, criatividade, inteligência e talento. Sua vida, muitas vezes, chega a se confundir com a mitologia popular. Tratava-se de alguém que não enxergava com os limitados olhos de carne, mas com os olhos do espírito, capazes de ir muito além do horizonte. E sua memória continuará entre nós até que as rimas deixem de existir; ou seja, para sempre! -Comum, em minha infância, apelidarmos as crianças que usavam óculos nossos amigos de sala de aula, das brincadeiras em final de tarde na nossa rua de Cego Aderaldo. Os nerds de hoje, por conta dos óculos, são os Cegos Aderaldo de minha infância. Temo o apelido se extinguir, nos novos tempos de nerds e de grande crescimento tecnológico. Este livro é pela manutenção do apelido de Cego Aderaldo. Cada vez que chamarmos alguém de Cego Aderaldo estaremos, mesmo inconscientes, evocando a figura do fenomenal cantador. Escrevo este livro buscando dotar o ‘inconsciente coletivo do apelido’ de verídicas informações sobre o cantador Cego Aderaldo.