Já disse alguém que a vida em família pode ser tão benéfica para o indivíduo quanto a vida em uma gaiola é benéfica para um papagaio. A despeito da segurança e do apoio que proporciona, a vida entre familiares desgasta, enfraquece e limita. O tipo de dano que a família pode provocar em seus membros é quase sempre inconsciente e difícil de identificar, porque é perpetrado em nome do amor, da união, das boas intenções. Em seu belo romance, Breu, Mário Araújo conta a história de uma família que busca “proteção contra a fúria da natureza”. A natureza, no caso, é o dano auto infligido, a tendência à autodestruição. O que une os membros dessa família, mais que os laços de sangue, são a experiência da perda e os mortos que compartilham, num legado de tragédia e decadência passado de pai para filho. Ou, como diz Mário Araújo sobre as mulheres da família: “gerações que se sucediam dando origem a pássaros de voo cada vez mais curtos”.