“Diálogos de olhos”, estreia de Saulo Pessato no gênero crônica, é um livro memorialista. Tanto melhor, é o caso de se dizer! Sendo a crônica um gênero que entrelaça realidade e ficção, e a memória sendo esse artefato imaterial que altera nossas percepções sobre o passado, o resultado é que essa conjunção entre gênero e estilo afasta a obra de qualquer tipo de personalismo confessional, transformando-a num baú de experiências com as quais facilmente podemos nos identificar. Numa das crônicas, aliás, Pessato acaba definindo, sem a pretensão de definir, o que é essa coisa meio indefinível chamada memória. Nem sei se foi isso mesmo o que eu disse. Estava tão nervoso com o momento, que não lembro nem se falei qualquer coisa. Modificando o real, preenchendo lacunas, apagando preenchimentos para tornar a preenchê-los com ficções travestidas de realidade, a memória imiscuiu-se de tantas formas naquelas pequenas fendas contidas entre as palavras, que acabou transformando-se numa espécie de coautora do livro. Nada mal para um autor que, mesmo declarando-se super esquecido em uma das crônicas, escreveu um livro todo feito de não esquecimentos.