No palco de um teatro quase desprovido de platéia, D. Pedro e as elites política e intelectual brasileiras, através dos jornais e da cultura política expressa nos folhetos, encenaram, juntamente com a elite portuguesa, o drama da emancipação do Brasil, cujos motivos, porém, não se encontravam nas idéias abstratas do liberalismo ou de uma consciência nacional. No primeiro ato, a trama dos acontecimentos desfez a ilusão de um único império constitucional. No segundo, a força dos interesses concebeu a solução separatista de um novo império, ainda que prisioneiro das mesmas permanências do Antigo Regime, que tinham conduzido àquela situação. Num terceiro, construiu-se um imaginário da Independência na medida das necessidades do país, que ainda hoje nos desafia. Os anos 1821 e 1822 foram certamente marcados por súbitas mudanças no mundo luso-brasileiro. As transformações mais profundas, porém, não foram as políticas, mas as mentais. Num período muito breve, certas palavras adquiriram novos sentidos. Outras foram usadas pela primeira vez. Todas procurando expressar conceitos inéditos e totalmente inovadores. Seja despotismo, tirania, absolutismo; seja cidadão, liberdade, igualdade, constituição; ou ainda pátria, nação, independência - tais palavras cruzaram o oceano e entraram estrondosamente no discurso público da América portuguesa, criando uma espécie de tiroteio verbal entre os dois lados do Atlântico. E aquilo que até então constituíra segredo de palácio, discutido nas salas privadas da Corte, virou notícia na praça pública e assunto de conversas nas ruas.