Reunião das três peças mais importantes de Samuel Beckett: Esperando Godot, Fim de Partida e Dias Felizes. Os três volumes contam com tradução do professor e ensaísta Fábio de Souza Andrade, textos críticos, fotos e sugestões de leitura A obra de Beckett (1906-1989), autor irlandês vencedor do Nobel de 1969 e considerado um dos maiores escritores da era moderna, é marcada pelo intenso anseio de silêncio e aniquilação. Para ele o mundo carece de sentido e toda expressão é fútil, não cabendo ao escritor outro papel que não seja o de expressar essas ideias. Escrevendo em inglês e em francês,- como garantia de que sua obra permanecesse em luta constante com o próprio espírito da língua -, o autor esvaziou o mundo da narrativa tradicional de seus elementos básicos, optando por criar histórias despojadas de enredo e brilho. Os principais temas dessas narrativas são os problemas da existência e da identidade do eu, o hábito e a rotina tomados como elementos corrosivos da era moderna, a natureza absolutamente ilusória dos contatos sociais e a trágica dificuldade do homem de tomar consciência de si mesmo diante da passagem do tempo. Sperandeo Godot Junto a uma árvore desfolhada, no meio de um descampado, dois vagabundos, maltrapilhos mas pontuais, atendem dia após dia ao chamado de um certo senhor Godot, que prima por não comparecer ao encontro supostamente marcado. Esta é a substância escassa de Esperando Godot, que se firmou como um divisor de águas no teatro do século XX, questionando toda a tradição dramática do Ocidente. Escrita em francês, durante o pós-guerra, a peça estreou em Paris no ano de 1953. Os recursos cênicos e narrativos aqui utilizados por Becket logram atingir uma dimensão mítica com meios que eram, na época, e até hoje, absolutamente inovadores: a disjunção do modelo retórico das falas, a profundidade trágica em personagens clownescos, a gestualidade dramática ganhando ares de coreografia, o abandono dos solilóquios em favor das exposições narrativas etc. Fim De Partida Concebida em 1954, Fim de Partida não só remodela a estrutura do gênero dramático como também nos oferece muito do universo do autor. A partida funciona como uma moldura dramática ao nos entregar a forma do mito através do qual Beckett contempla a condição da sociedade humana em que vida e morte são duas peças do mesmo jogo. Nesta peça de um ato Hamm, Clov, Nagg e Nell - o tirano, seu criado, e seus pais - mantêm pouco (ou quase nenhum) contato com o mundo exterior. À beira do fim, dialogam espelhados na posição de vantagem, na luta de poder e na família. Para tanto, Beckett cria uma trama cujo espaço se dá em algum lugar entre a vida e a morte no qual as quatro personagens vivem baseadas em "relações humanas destruídas". A peça inicia-se no princípio do fim, minutos antes da última jogada, que não acontece nunca. Dias Felizes Logo após o choque violento que as duplas dos protagonistas outsiders Estragon e Vladimir (Esperando Godot) e Hamm e Clov (Fim de partida) causaram ao portentoso edifício das formas assumidas pelo teatro ocidental desde suas origens gregas, Beckett iria detonar também os poucos escombros que haviam sobrado, concebendo Dias felizes, a história de uma vaidosa mulher de meia-idade - Winnie -, enterrada sob um sol a pino em uma colina seca (no primeiro ato, até a cintura; no segundo ato, até o pescoço), e de seu inerte marido, Willie. Nos dois atos da peça, Winnie nada mais faz do que se apegar a ritos cotidianos. Entre falas entrecortadas e vacilantes - nas quais se sobressai o bordão "Ah, aqueles dias felizes" (que Beckett tomou de um poema de Verlaine e de uma canção popular americana) - faz passar o tempo, distraindo-se, assim, de sua tragicômica situação.