O escritor americano Donald Barthelme (1931-1989) tem uma obra que hoje pode ser considerada disruptiva, ou seja, que transcende qualquer expectativa e traz algo sempre novo e surpreendente à, no caso dele, escrita literária. Um dos expoentes do chamado pós-modernismo, o autor de livros, ensaios, contos e romances marcou a cultura americana e influenciou toda uma geração de grandes romancistas como Salman Rushdie, David Foster Wallace e Dave Eggers. Autor de um dos clássicos do movimento pós-modernista americano, O pai morto, lançado em 1975 (e no Brasil, pela primeira vez, pela Rocco em 2015), Barthelme recorre à escrita como um exercício de experimentação. Isso pode ser claramente comprovado no novo lançamento do autor, Grandes Dias e outras histórias, uma antologia de 40 contos no qual o disruptivo escritor dá mais destaque ao estilo que, necessariamente, ao conteúdo: algumas vezes, textos corridos, em fluxo de pensamentos; em outros, diálogos aparentemente ou tão somente sem sentido, não-linear, que leva o leitor a passear pela frivolidade e pela mais escancarada sinceridade humana. Em relação ao conteúdo em si, ele é nervoso, seco, direto, limpo quase telegráfico e, por vezes, um tanto agressivo. Seus personagens incorporam, assim, como sua obra, comportamentos estranhos, presunçosos e ridículos em diálogos e textos em que prevalecem o nonsense e o absurdo. É o caso de Chablis, em que o autor explora os sentimentos ambíguos de um pai em relação à sua filha pequena, depois de irritar-se com o pedido da esposa para comprar um cachorro e o transtorno emocional que isso lhe provoca. Já em O gênio, vemos um homem de grande intelecto, que passa o conto recebendo toda sorte de homenagens, mas que, na verdade, não passa de um alcóolatra excêntrico que detesta crianças e carrega documentos importantes em uma caixa de ferramentas verde de uma grande loja de departamentos.Em sua breve existencia, Donald Barthelme (1931-1989) se destacou como jornalista, editor de revistas de arte, diretor do Museu de Arte Contemporanea de Houston e professor (foi um dos criadores do programa de Escrita Criativa da Universidade de Houston). Como se isso nao bastasse, foi ainda um escritor prolifico e bem-sucedido, aclamado como um dos grandes nomes da literatura pos-moderna norte- -americana, rotulo que ele aceitava com desconfiada resignacao. Barthelme foi, com certeza absoluta, um dos maiores escritores de contos de todos os tempos, dotado de tecnica infalivel, melancolica alegria e invulgar versatilidade. Tanto podia escrever um conto no estilo de Tchekhov, quanto historias destituidas de tramas e narrativas que continuam a desafiar os rotulos. Na tentativa de definir Grandes dias e outras historias, Matt Lewis, critico do prestigioso The Guardian, comentou entusiasmado que aqui podem ser encontradas fabulas, narrativas lendarias, cartas e ensaios, alem de textos compostos inteiramente por dialogos e, tambem, eventualmente, contos mais fieis aos parametros consagrados do genero. Ja David Eggers, que assina a instigante introducao deste livro, nao hesitou em afirmar que a escrita de Donald Barthelme e divertida, sutil, bela e mais aparentada com a poesia (em sua perfeita ambivalencia em relacao a narrativa) do que praticamente qualquer outra prosa atual . Ambos estao certos, porem a literatura de Barthelme e isso e muito mais, razao pela qual ele ja foi comparado a autores tao talentosos e diferentes entre si quanto James Joyce, Vladimir Nabokov, Jorge Luis Borges, Virginia Woolf e Samuel Beckett. E ler para crer...