É curioso que uma virgem, que lamenta morrer sem marido e sem filhos, revele total indiferença pelo noivo Hemon. Essa indiferença surpreende ainda mais se lembrarmos que Antígone, desde o início da tragédia, mostra-se consciente da punição que decorrerá do enterro de Polinices. Ou seja, Antígone sabe que vai morrer e concentra toda sua energia no ato que acelera seu fim. [?] É a impossibilidade de deslocar seu desejo para fora do âmbito de uma família marcada pelo incesto o que a leva a ignorar o próprio noivo? ? é a reflexão que Trajano Vieira faz sobre um dos textos mais poderosos da chamada Tragédia Grega. Por original que seja, ele não esgota nem exclui interpretações como a de Steiner, Vernant e Reinhardt, cujas percepções, assim como de uma tradição várias vezes milenar da exegese tragediográfica, apenas dão a medida da amplitude intelectual, existencial e humana do texto criado por Sófocles.