Havia meses que não se via um fiapo delas no céu, reverberando agora feito um espelho que doía nas vistas. Foi quando deram sinal na manhã abrasadora de fevereiro que estavam prestes a chegar das lonjuras do mar. Ainda tímidas passaram como se fossem pedaços de algodão. Daí a uma semana fizeram com que manchas espessas trafegassem vagarosas acima do rio. Até que boiaram como grandes anáguas roçando as alturas e chegaram a inventar aranhas de ouro nas escarpas. Lençóis compridos foram se esgarçando rumo ao poente. Tornaram-se uma só cantiga de amor, que correu na cidade, quando apareceram pela tarde com uma cor cinzenta feito chumbo, de repente escurecendo todo o teto do céu. E trouxeram à noite as chuvas benditas, aquelas mesmas que fazem brotar o verde da relva, a vida amanhecer com um cheiro cheiroso de terra molhada.