Mais um médico escritor no Parnaso rio-grandense: Vi nascer cada um dos contos deste livro e os re-leio com a mesma emoção do primeiro dia. Ou talvez com mais emoção ainda, porque estão publicados numa edição digna do talento de Lucio Feliciate. Um ser humano de rara sensibilidade, que se revela por inteiro em cada história que nos conta, modulando muitas vezes sua voz poderosa para sussurrar ao ouvido do leitor, ou falar em italiano, idioma que aprendeu na infância. Aliás, é das suas recordações de menino que nasceram muitos contos desta coletânea. E isso porque Mariana, sua neta de sete anos, tem sido inspiração benfazeja ao processo criativo do avô. Mas é a profissão de médico legista, que exerceu durante muitos anos, a gênese do personagem Francesco Firenze, seu alter ego que, no conto "O trem", se apresenta de forma genial àquele que o criou a sua imagem e semelhança: Ao escreveres minha história, que é a tua, voltaste a sentir a vida pulsar em tuas artérias. A tradição de médicos escritores no Rio Grande do Sul passa por talentos como Dyonélio Machado, Cyro Martins, Moacir Scliar, para citar apenas alguns com os quais tive a honra de conviver, e que já nos deixaram. Lucio Feliciate incorpora-se com naturalidade a essa galeria, não somente pela rara qualidade do seu texto, mas porque reserva ao exercício da medicina legal, quase desconhecida da literatura, alguns de seus melhores contos. Muitos deles antecedidos por epígrafes que são verdadeiros ornamentos da sua ampla cultura. Dito isso, chamo atenção do leitor, como no teatro antigo, que já soaram as três pancadas e o pano se ergueu. Bem-vindos "À Casa Abandonada". - Alcy Cheuiche, Porto Alegre – Feira do Livro de 2017.