Entre a memorialística e o ensaio, O negativo do rastro é um exercício de investigação do mundo. Filipe Fernandes Bonita é um filósofo. Sua filosofia está tanto na reflexão como nas referências de que lança mão ao examinar o real de forma sensível e tatear os estímulos da natureza e da cultura na vida de um indivíduo. Aqui, cada objeto que povoa nossa infância vira um totem a nos perseguir eternamente, e sobre eles edificamos nossas estruturas. Seja um quadro na parede da casa para o qual olhamos obsessivamente durante toda uma vida ou a cena banal de um vizinho sacudindo o tapete pela janela, criamos mundos a partir desses estímulos. Podemos fazê-lo de maneira automática, de modo a evitar a dor de estar vivo, ou como um eterno explorador, atento e exposto aos perigos. Ao adulto é impossível escapar dessas escolhas. Em O negativo do rastro a mitologia tem papel de decifrador da experiência, verdadeira chave-mestra: heróis e deuses que vieram antes nos apontam a trilha e nos (...)