Mais um Javier Cercas chega ao Brasil. E a boa notícia é que este novo romance confirma o juízo de Mario Vargas Llosa sobre a arte do autor, no lançamento de Soldados de Salamina. Em 2001, o Nobel escreveu no jornal El País que o livro, magnífico, merecia ser lido por muita gente - sugestão plenamente aceita, a julgar pelo mais de 1 milhão de exemplares vendidos e por sua adaptação ao cinema - para as pessoas poderem comprovar que a literatura séria, "que se atreve a abordar temas complexos, também é capaz de encantar o leitor, bem como afetá-lo de outras maneiras", que é exatamente o que acontece com este As leis da fronteira. A trama é aparentemente simples, mas nem por isso menos envolvente: Ignacio Cañas, um adolescente de classe média, conhece, num fliperama do seu bairro, dois delinquentes da sua idade, Zarco e Tere, que vivem no lado pobre da cidade, e esse encontro mudará sua vida para sempre. Trinta anos depois, um escritor colhe material para um livro sobre a vida de Zarco que, nesse meio-tempo, se transformara num mito da delinquência juvenil. Embora desta vez o foco da narrativa se desloque de forma mais evidente da Grande História - a Guerra Civil, em Soldados de Salamina; a Guerra do Vietnã em A velocidade da luz; o golpe de 23-F, em sua obra anterior, Anatomia de um instante - para a pequena, aqui também temas fundamentais estão presentes: o lado selvagem da transição espanhola, marcado por assaltos e pela droga; a denúncia da desigualdade que, com suas fronteiras mais ou menos visíveis, divide as cidades; o mito da delinquência juvenil, que o autor se propõe a demolir, e a crítica feroz à mídia que ajudou a construí-lo.