Manuel aquela tarde avistou a precisão da pelagem dos cães soltos a zanzar seu abandono, distinguiu a irregularidade dos intervalos entre as pedras da calçada e o atrevimento vegetal que se insinuava por eles, divisou os cristais refugiados sob a areia mais espessa da praia, descortinou a sombra de uma nuvem projetada no chão e se certificou de que tinha a forma de um barco prestes a naufragar, enxergou o verniz das unhas de um pardal que alçou voo à sua frente, e registrou o rastro desse voo. Olhou olhou olhou. O grau é fraquinho, mas para Manuel é toda uma hipérbole translúcida que a correção das lentes lhe garante traçar e apreender, parábola da vida.