"Quando uma utopia desmorona, é toda a circulação de valores que regulam a dinâmica social e o sentido de suas práticas que entra em crise. É esta a crise que vivemos. Prometia-nos, a utopia industrialista, que o desenvolvimento das forças produtivas e a expansão da esfera econômica liberariam a humanidade da penúria, da injustiça e do mal-estar; que dariam, com o poder soberano de dominar a natureza, o poder soberano de determinar a si mesma; que fariam do trabalho a atividade demiúrgica e ao mesmo tempo autopoiética na qual o aperfeiçoamento incomparavelmente singular de cada um seria reconhecido - direito e dever a um só tempo - como parte da emancipação de todos. Da utopia, nada resta. Isto não quer dizer que tudo seja doravante vão e que só resta submeter-nos ao curso das coisas. Isto quer dizer que é preciso mudar de utopia; pois enquanto formos prisioneiros daquela que se esvai, continuaremos incapazes de aquilatar o potencial de liberação que a transformação ora em curso contém e incapazes de a ela imprimir um sentido apropriado."