Este livro reúne, na verdade, 2 obras quase distintas: A Arte da Teshuvá apresenta, de forma elucidativa, os profundos ensinamentos do rabino Abraham Yits'chac Kook sobre a teshuvá, conforme descritos no livroOrot Hateshuvá. O livro lança uma nova luz sobre o assunto, desmistificando a idéia de que a teshuvá é exclusiva àqueles que, da noite para o dia, transformam totalmente suas vidas. Teshuvá significa retorno, embora seja constantemente traduzido como arrependimento. Trata-se de um processo vital, profundamente arraigado no interior do ser humano. A teshuvá é inerente a todos, e não está restrita apenas ao aspecto religioso da vida, mas transcende a todos os outros aspectos da existência. Na segunda parte desta edição em português encontra-se também a tradução do texto integral de Orot Hateshuvá, sob o títulode Luzes do Retorno. A abordagem penetrante do rabino Kook sobre a teshuvá nos faz compreender melhor este fenômeno e sua importância central na Criação, em suas diversas implicações para o indivíduo, para a nação de Israel e para toda a humanidade. A Arte da Teshuvá e Luzes do Retorno por Uri Lam No início deste ano, fui indicado pelo professor Jairo Fridlin, da Editora Sêfer, para realizar um trabalho de enorme responsabilidade: traduzir Orot Hateshuvá, do rabino Avraham Yits´chak Hacohen Kook (1865-1935), o primeiro rabino-chefe de Israel. Imediatamente percebi que não se tratava de mais uma tradução: afinal, Luzes do Retorno seria o primeiro livro de Rav Kook publicado integralmente em língua portuguesa. A mim foi confiada a tradução da versão em inglês e ao rabino Ariel Wajnryt, a tradução a partir do original em hebraico. Além disso, resolveu-se acrescentar no mesmo volume o livro A Arte da Teshuvá, traduzido por Daniel Presman, sheliach do Bnei Akiva de São Paulo. Daniel destaca a importância fundamental de Rav Kook como exemplo de sabedoria e devoção a Deus, além da dedicação singular ao povo de Israel, à Torá de Israel e à Terra de Israel, e o inspirador do Bnei Akiva desde a sua criação. A Arte da Teshuvá, do rabino David Samson e de Tsvi Fishman, tido como um guia indispensável na compreensão do texto de Rav Kook, comenta detalhadamente suas palavras e busca esclarecer seus ensinamentos profundos com exemplos voltados ao homem contemporâneo. Rav Kook foi um líder religioso de estatura histórica, poeta, pensador original e defensor ferrenho do renascimento sionista na Terra de Israel. Rabino ortodoxo, encontrava um sentido religioso e redentor junto ao sionismo laico dos primeiros chalutsim (pioneiros) e condenava vigorosamente a idéia de que os judeus religiosos deveriam se afastar dos não-religiosos. Atualmente seus escritos são tema de estudo tanto em yeshivot como em universidades de Israel. Biografia Avraham Yits'chak Hacohen Kook nasceu no dia 16 de Elul de 5625 (25 de setembro de 1865), um Shabát às vésperas de Rosh Hashaná, em Griwa, pequena aldeia na região báltica da Rússia. Aos 13 anos saiu de sua cidade natal e foi estudar com grandes mestres, destacando-se como aluno brilhante. Além dos estudos correntes, dedicou-se aos estudos de Filosofia e Cabala. Aos 23 anos foi incumbido de ser guia espiritual em pequenas kehilot russas. Com a emergência dos movimentos socialistas entre os jovens judeus russos, culminando com as primeiras aliót, em 1904 Rav Kook aceitou o convite para ser o rabino da pequena kehilá de Iafo. Sua importância foi logo reconhecida pelos grandes rabinos de Jerusalém. Ele sustentava que a Terra de Israel seria redimida pelo movimento de Teshuvá. Em suas palavras: "Todos os construtores da nação irão chegar à profunda verdade deste ponto e (...) irão proclamar (...) com um forte clamor: 'Venham e vamos retornar ao Eterno'. Esta teshuvá, teshuvá de verdade será" (Luzes do Retorno 15:11). Em 1914 Rav Kook viajou para a Europa a fim de participar do Congresso Mundial de Agudat Israel, mas este coincidiu com o início da Primeira Guerra Mundial e foi cancelado. Exilado, tornou-se rabino da comunidade Machzikê Hadat, em Londres. Retornou a Israel em 1919 e foi designado rabino-chefe de Jerusalém. Dois anos depois, com a criação da Rabanut Harashit (o Superior Rabinato), foi eleito o primeiro rabino-chefe ashkenazí de Israel. Em discurso por ocasião da inauguração da Universidade Hebraica de Jerusalém, em 1925, Rav Kook apresentou sua concepção da síntese entre os estudos religiosos e laicos. Ele sustentava que a nova universidade deveria ser uma combinação de ambos, com os estudos laicos condicionados ao desenvolvimento em busca de uma profunda devoção pela vida em santidade. Em 1935, pouco antes de completar 70 anos, Rav Kook foi acometido de uma doença da qual não iria mais se recuperar e faleceu no dia 3 de Elul de 5695 (01 de setembro de 1935). Luzes do Retorno "Orot Hateshuvá é um livro escrito para todos", afirma o rabino Ariel Wajnryt, no seu prólogo à edição brasileira de Luzes do Retorno. Idealizado muitos anos antes, foi o único editado ainda em vida pelo Rav Kook, em 1925. Segundo o rabino Wajnryt, trata-se de uma obra voltada "para o poeta e para o filósofo, para o interessado em meditação e para o interessado em mística, para quem busca conceitos profundos e para quem busca viver bem", ou seja, uma obra que permite infinitas possibilidades de leitura. O rabino Raphael Shammah destaca ainda a forma poética com que Rav Kook apresenta suas idéias, ao mesmo tempo em que ilumina e esconde "uma riqueza de pensamentos e aprofundamento nas palavras de nossos Sábios". Nesta obra, o tema da teshuvá - desenvolvido após uma intensa luta interior que impelia Rav Kook a se expressar em prol da sua geração e das próximas, do indivíduo e da coletividade - é apresentado como a cura e a redenção de Israel. O abismo existente entre o pensamento religioso e o ritmo dinâmico da sociedade contemporânea era para ele fonte de muita preocupação. Como um profundo erudito, Rav Kook esforçou-se por conciliar o imediato com o eterno, o antigo com o moderno. Em seu modelo, o mundo é sustentado por Deus, que é imanente e transcendente. O indivíduo e a coletividade participam desta unidade, podendo exaltá-la ou destruí-la. A teshuvá, mais do que um retorno à religiosidade, é vista como uma ascendência à Divindade. Por meio dela tudo se renova como bondade suprema, iluminada e clara. O ser humano é visto por Rav Kook como inerentemente bom. O mal, que é o afastamento de Deus, causa desequilíbrio e angústia, ansiedade e desespero. Mas o próprio mal é visto como benéfico, pois traz dentro de si a esperança da existência do bem a ser perseguido. Por sua vez, a teshuvá traz de volta a alegria e o prazer de se estar em harmonia com o mundo e com Deus. A busca pessoal do aperfeiçoamento tem conseqüências benéficas para a coletividade e para o mundo inteiro. Esta é a essência da filosofia de Rav Kook: a garantia de que o ser humano é inerentemente bom e que o desejo pela virtude irá triunfar, tanto na vida do indivíduo como na da comunidade. Na época em que vivemos, de questionamentos acerca do futuro do povo judeu na Terra de Israel, a publicação de A Arte da Teshuvá e de Luzes do Retorno serve de inspiração para todo aquele que busca a santificação do povo judeu e a realização do retorno e redenção da Terra de Israel.