Aught não é nada. É, no mínimo, uma bagatela ou uma partícula. É talvez o zero. Mas é algo que deve ser feito, para alguns, uma obrigação.A escrita poética desafiadora de Alan Cardoso da Silva, neste seu Aught – primeira partícula de sua bibliografia, é o resultado de um processo que já acompanho de perto há um tempo: o desse poeta brasileiro, vindo de Belford Roxo (RJ), se infiltrando numa língua estrangeira e, lá de dentro, retorcendo suas entranhas como só um falante não-nativo poderia. Com seus brasileirismos e influências da poesia moderna e contemporânea, as experimentações realizadas nos poemas de Aught contorcem o corpo da língua inglesa, nos deixando resultados que apenas o fazer poético audacioso é capaz de entregar.Se estrangeirizando ao escrever em inglês e estrangeirizando a própria linguagem estrangeira, Aught revela o dever de toda poesia: estranhificar a comunicação usual. Afinal, o poema diz uma coisa dizendo outra, ou diz algo justamente quando nada diz. O inglês estranho de Alan Cardoso da Silva se encaixa nessa possível fração do entendimento poético.Perseguindo esse zero, o pouco que se entende de um poema - que fala melhor fazendo silêncio - o poeta fluminense alcança as margens de terras anglófonas e além feito um terremoto. Seu “imp;ossible” impossível ou seu Heliogábalo balbuciante revelam um poeta novo, mas que já assume com todas as letras seu papel como poeta, um cozinheiro de palavras, que, com suas duas línguas, as põe à prova com sabor.Entendendo que o poema sempre se perde na tradução, mesmo que na mesma língua, entendo que ele sempre fica devendo se explicar, Aught é dever e, por isso, dever cumprido.Pedro Ávila, poeta e amigo