A poesia de José do Carmo Francisco, tão simples, tão bela e simultaneamente tão arrojada, evoca nostalgia, amor ao pequeno fato que, todavia, tem um universo próprio. Um humor magoado que se transfigura e que nos dá, por extenso ainda que sobriamente, uma grande e bela indignação antes as injustiças da sociedade, fidelidade à infância e aos seres que a preencheram, ligação ao sinal próprio do homem, patente em retratos de figuras tutelares e, finalmente, a discrição e a serena mágoa que são freqüentemente o prólogo da mais justa alegria não profanada por sistemas de valores discriminatórios. Carmo Francisco é um poeta multifacetado, claramente tributário de Florbela Espanca no que esta tinha de intenso, magoado e repleto de paixão. Humor magoado e incursão pelo cotidiano são características maiores da sua poesia, que sabe muito bem levar a água ao seu moinho poético onde a farinha é de diversas cores: a cor cinzenta da vida-vidinha, a cor violeta de um fantástico social que se desprende dos poemas assumidamente simples. Sua poesia sabe ser discreta, sem aquelas redundâncias que anos e anos de metafísica mal assimilada nos habituaram a verificar em certos poetas, alguns dispondo mesmo de certa aura. Por intermédio de uma brusca inflexão, o poeta conduz-nos então na direção certa. E o que ainda é melhor é que nós, leitores, podemos chegar a ela sem ser necessário exagerar na indicação.