"No dia seguinte foi aberto o testamento com todas as formalidades legais. (...) O conselheiro declarava reconhecer uma filha natural, de nome Helena, havida com D. Ângela da Soledade. "A leitura desta disposição causou natural espanto à irmã e ao filho do finado. D. Úrsula nunca soubera de tal filha. (...) Reprovou de todo o ato do conselheiro. Parecia-lhe que, a despeito dos impulsos naturais e licenças jurídicas, o reconhecimento de Helena era um ato de usurpação e um péssimo exemplo. A nova filha era, no seu entender, uma intrusa, sem nenhum direito ao amor dos parentes; quando muito, concordaria em que se lhe devia dar o quinhão da herança e deixá-la à porta. Recebê-la, porém, no seio da família e de seus castos afetos, legitimá-la aos olhos da sociedade, como ela estava aos da lei, não o entendia D. Úrsula, nem lhe parecia que alguém pudesse entendê-lo. (...) Nada constava da mãe, além do nome; mas essa mulher quem era? em que atalho sombrio da vida a encontrara o conselheiro? Helena seria filha de um encontro fortuito, ou nasceria de algum afeto irregular embora, mas verdadeiro e único? A estas interrogações não podia responder D. Úrsula. (...)"