Quando o filósofo Gilles Deleuze empreendeu sua análise do cinema moderno, ele reconheceu, nos filmes dessa categoria, novos modos de lidar com o tempo. Nesse cenário, os protagonistas também tiveram seu papel reformulado. De senhores de seu próprio destino, passaram a perambular por situações nas quais não há nada a ser resolvido, apenas experienciado. Da mesma forma, o protagonista de Disco Dublê, o DJ Vazante, perambula por cenários, acontecimentos e eventos em que o melhor a se fazer é flanar, como propunha Walter Benjamin. No exílio proporcionado pelos seus inseparáveis fones de ouvido, capuz e óculos escuros, DJ Vazante sobrepõe aos cenários de diversas metrópoles a trilha sonora de sua vida, permeada ora pelo que ele ouve nos fones, ora pelo que sua memória puxa de momentos diversos de sua longa carreira discotecando por festivais ao redor do mundo. Em Disco Dublê, muito mais do que uma experiência auditiva e cultural, a música pop se apresenta como um fenômeno multissensorial e onipresente. Ao longo do romance, vai se transformando de um objeto passivo na narrativa para um agente que condiciona as situações em que DJ Vazante acaba por se envolver. Arrisco dizer que se trata deuma co-protagonista que faz a trama circular e expandir, como um ritmo eletrônico em loop. Nessa mistura exuberante de referências conceituais e artísticas é que Mauricio Salles Vasconcelos parece querer inserir o leitor nos encontros e desencontros da intensa vida de um DJ. Multissensorialidades de um romance-música.