Tudo começou com uma fotografia. Aos 49 anos, a escritora norte-americana Anne Kreamer ficou chocada ao se ver numa foto clicada alguns meses antes: ladeada pela filha de 16 anos e de uma amiga de cabelos grisalhos, ela ocupava o centro da imagem com seu "capacete envernizado de cabelos escuros demais". Anne não se reconheceu ali, ensanduichada por uma adolescente e uma adulta de bem com a própria maturidade. O que via era apenas uma versão de si mesma - uma mulher de meia-idade confundindo jovialidade com excesso de tinta nos cabelos. Na fotografia, sua filha e sua amiga pareciam pessoas reais, enquanto ela parecia alguém fingindo ser alguém mais jovem. A escritora foi obrigada a reconhecer: não estava preparada para ter a "aparência" de sua idade. Se assumisse a cor natural dos cabelos, temia instantaneamente parecer mais velha. E aí se chegou ao "xis" da questão: qual o problema de se ter a aparência de sua idade cronológica? Com essa pergunta em mente, Anne Kreamer deu início às pesquisas e entrevistas que deram origem a Meus Cabelos Estão Ficando Brancos - Mas eu me sinto cada vez mais poderosa, lançado pela Editora Globo no Brasil. No livro, Anne relata seu processo pessoal de descoberta e auto-aceitação a partir do momento em que decidiu parar de pintar os cabelos, depois de 25 anos de devoção absoluta às tinturas. E conta como os cabelos grisalhos a reposicionaram no mundo, proporcionando-lhe uma nova visão sobre beleza, sexo, trabalho, maternidade, autenticidade e tudo o mais que realmente faz diferença na vida. Nos Estados Unidos - onde 65% das mulheres pintam os cabelos - a obra de Anne Kreamer acendeu a chamada Gray War, polêmica que põe em campos opostos as defensoras radicais das tinturas e as seguidoras do look natural. A escritora e cineasta Nora Ephron, por exemplo, afirma com ironia em seu livro mais recente (Meu Pescoço é um Horror, também dedicado às agruras do envelhecer) que a verdadeira revolução na vida da mulher contemporânea não foi deflagrada nem pela aeróbica nem pelo feminismo - mas, sim, pela tintura de cabelo, que estaria assegurando a uma legião de mulheres "sem idade definida" a auto-estima necessária para batalhar e manter seu lugar no mercado de trabalho. Advogando pela causa das "mulheres sem-tinta", o livro de Anne questiona os padrões estéticos, discute o ideal de eterna juventude da sociedade moderna e busca opiniões de diversas personalidades a respeito do dilema cromático-capilar: entre outras "poderosas" de meia-idade, a autora conversou com a escritora Mireille Giulianno (presidente da Veuve Clicquot e autora do best-seller mundial As Mulheres Francesas Não Engordam), a atriz Frances McDormand (premiada com o Oscar por Fargo) e, claro, com a própria Nora Ephron (diretora de filmes como Mensagem Para Você). Para fundamentar sua argumentação, Anne bebeu das mais variadas fontes de pesquisa, como um questionário respondido por cerca de 500 grisalhos de todas as idades. Conversas com consultores de imagem e headhunters também serviram para mostrar que a verdade sobre os cabelos brancos é bem diferente daquilo que nos acostumamos a acreditar. Como, por exemplo, a lenda de que mulher grisalha não é sexy. A autora derruba esse mito exibindo o resultado de um inusitado "test-drive". Ela mesma postou duas vezes seu perfil pessoal para um famoso site de encontros pela internet. Num dos perfis, anexou sua foto com cabelos escurecidos; no outro, sua imagem ao natural. Em pouco tempo, o retorno não deixa margem a dúvidas: a Anne Kreamer grisalha vence o confronto com ampla vantagem, recebendo o triplo de convites de homens interessados em conhecê-la pessoalmente. Meus Cabelos Estão Ficando Brancos é uma história de desenvolvimento pessoal, como confirma a autora no seguinte trecho da obra: "Acho que a cada ano, à medida que meu cabelo fica mais branco, eu estarei um pouco mais pronta para celebrar as boas coisas a respeito do meu ‘aqui e agora’. Tenho todas as intenções de evitar o estereótipo da velhinha frágil, assustada - de permanecer tão em forma e curiosa quanto possível -, mas já não tenho mais medo de mostrar minha idade verdadeira. É simples. Tenho orgulho do que fiz, dos anos que vivi, de até onde cheguei. Estou mais feliz ao atravessar cada dia - na calçada, nas lojas e restaurantes, em reuniões - sendo tão honesta quanto posso a respeito de quem realmente sou".