O poeta Murilo Mendes dizia que só não existe o que não pode ser imaginado. A frase, adotada como epígrafe de A Ira das Águas, de Edla Van Steen, define o espírito do livro e a absoluta liberdade de construção temática adotada pela autora.
Recriando o existente, imaginando o inexistente e prendendo-os na mesma trama, Edla consegue criar em todos os sete contos do livro um clima de incerteza e de mistério, cuja origem pode se encontrar no inexplicado das situações ou nas mentes das personagens.
Há tramas que se equilibram como no fio da navalha, como no provocativo “Mãe e Filho”, onde a revelação de um segredo de namorados balança duas famílias, e em “Mania de Cinema”, a eclosão de um mundo de lembranças de uma mulher madura, provocada por uma observação de um antigo namorado.
Encontros e desencontros físicos e psicológicos assinalam contos como “Nojo”, no qual Edla mostra-se em pleno domínio do diálogo, justo, conciso e depurado, lembrando a sua condição de autora teatral de sucesso, e “Ela e Ele”, história de separação. O enigma de uma morte misteriosa é o tema de “Rua da Praia”.
“Um Dia como os Outros” mostra a violência urbana, sem complacência, vista pela ótica de suas maiores vítimas. “A Ira das Águas” é a narrativa mais longa e complexa do livro, em realidade uma novela, densa de humanidade, na qual Deonísio da Silva enxerga talvez o ponto mais alto de sua prosa no gênero das narrativas curtas.
Autora de sucesso nas áreas de cinema, literatura e teatro ( Primeira Pessoa, escrita especialmente para Eva Wilma, encontra-se em cartaz há vários anos, percorrendo o país), 25 livros publicados, quatro dos quais traduzidos nos Estados Unidos, com excelente recepção crítica, Edla van Steen apresenta um dos mais importantes conjuntos de obra da literatura brasileira contemporânea, enriquecido por essa A Ira das Águas.