Na presente década, a produção acadêmica sobre a participação em saúde no Brasil tem sido considerável, logrando-se grandes avanços na compreensão do modus operandi dos conselhos de Saúde. Contudo, as abordagens utilizadas nas investigações do vasto e heterogêneo universo conformado por esses colegiados têm levado à reiterada constatação das muitas dificuldades que o controle social vem encontrando para sua efetivação. E talvez não pudesse ser diferente, dado que quaisquer formatos participativos, no Brasil e alhures, apresentam disfunções em relação a seus elementos básicos: funcionamento, objetivos, representação/ representatividade, legitimidade e impactos. Entretanto, os projetos de pesquisa conduzidos por Soraya Vargas Côrtes, cujos resultados são brilhantemente aqui apresentados, conseguiram fugir das armadilhas da iteração mediante o desenho de um elaborado referencial teóricometo do lógico absolutamente inovador. Neste sentido, destaca-se, primeiro, o distanciamento das normas legais como parâmetro para analisar e avaliar as experiências estudadas, contornando, assim, a óbvia distância entre o mundo real e o marco normativo. Segundo, o foco é posto nos processos sociais e políticos que têm lugar nos foros participativos, em vez de enfatizar os aspectos deletérios da cultura política que impregnam as instituições brasileiras, o que permitiu apreender as inovações que os processos participativos estão introduzindo nas relações entre o Estado e a sociedade civil. Terceiro, adotou-se a tipologia neo-institucionalista que, entre outros recursos, possibilitou categorizar os diferentes segmentos representados nos conselhos de Saúde em atores governamentais, de mercado e sociais, bem como utilizar conceitos como comunidade política e redes de política para examinar as interações entre esses atores e as alianças de interesses configuradas ao longo dos processos decisórios. A lucidez da análise do Conselho Nacional de Saúde sob esse prisma descortinou, sem dúvida, inusitadas vertentes de conhecimento dessa crucial arena participativa, até agora, aliás, não escrutada em toda a sua complexidade e riqueza. Todos os capítulos do livro são em extremo importantes porquanto trazem à tona as especificidades dos colegiados em cada nível de governo e dos conselhos gestores em hospitais federais, cujo estudo constitui uma contribuição igualmente inédita ao tema da participação em saúde no país. A originalidade interpretativa, o rigor meto do lógico e a riqueza analítica constituem, em síntese, as características do livro Participação e Saúde no Brasil, cuja relevância para os estudiosos da democracia participativa e para o público em geral é ímpar.