"Quando a clarividência e o senso de análise, em relação a nós e aos outros, atingem ao máximo, dá-se na personalidade uma espécie de desdobramento. Passam a colidir no mesmo indivíduo um ser social, ligado à necessidade de ajustar-se a certas normas convencionais para sobreviver, e um ser profundo, revoltado contra elas, inadaptado, vendo a marca da contingência e da fragilidade em tudo e em si mesmo. Daí a incapacidade de viver normalmente e o nascimento do senso de culpa, ou autonegação." O trecho, extraído de "Os bichos do subterrâneo", o ensaio de Antonio Candido sobre a obra de Graciliano Ramos, diz muito das razões do protagonista da novela O estranho no corredor, a primeira incursão em prosa de ficção mais longa do contista e jornalista Chico Lopes. Aqui, um homem solitário, com aspirações a escritor, leva uma vida discreta, sobrevivendo precariamente como professor numa escolinha de inglês, gastando o tempo ora com o diário onde anota memórias de infância, ora com um círculo de conhecidos. A esse quadro - estático apenas na aparência, pois que dotado de enorme tensão interior - vem se somar a aparição misteriosa, recorrente, de uma figura masculina ameaçadora, que se põe a perseguir o protagonista por todos os cantos, acelerando o tempo da narrativa com seus passos de "uma musicalidade escura". Revolta contra a vida "subalterna e esmagada" - para retomar termos de Antonio Candido -, passado, seu discurso indireto livre salta fronteiras e precipita o leitor no rodamoinho de uma consciência atormentada, conferindo à narrativa um clima denso de filme noir com toques kafkianos e suspense de thriller metafísico, que se mantém da primeira à última página.Um clima de filme noir, com toques kafkianos e suspense de thriller metafisico, da o tom a O estranho no corredor, a primeira novela de Chico Lopes. Aqui um timido professor se ve perseguido por uma misteriosa figura masculina que o obriga a ultrapassar os limites daquilo que supunha ser sua identidade . Com prosa enxuta, mas ao mesmo tempo vertiginosa, uma obra rara, cujo parentesco mais proximo pode ser encontrado em Angustia, de Graciliano Ramos.