Este livro é fruto do trabalho de aproximadamente quinze anos de vida junto aos Seringueiros do Rio Ouro Preto, na Amazônia Ocidental, na sua trajetória em Defesa da Floresta e do seu direito à vida e a dignidade. É um livro fruto de muitas lutas, perdas e algumas poucas vitórias, garantindo que a Floresta Amazônica não seja devastada e tomada por queimadas, fazendas de gado e soja na intensidade pretendida por madeireiros, fazendeiros, e outros atores. Em troca da vida de milhares de seringueiros, que sucumbiram anonimamente por doenças, balas, angustia, por políticas públicas comprometidas com o agronegócio e sentenças judiciais lamentáveis, ganharam para seus descendentes, e para nós, seus leitores, a certeza de que uma vida decente vale a pena. Nesta convivência de 15 anos, conquistei a confiança de muitos e ao mesmo tempo sentia crescer a impotência por ver a devastação e a destruição ganharem terreno, a tristeza ao ver a floresta queimada, aparecia cada vez mais nas conversas, nas gravações e no sentimento que nutriam sobre o futuro. Ao longo deste tempo, foi necessário desenvolver uma capacidade de escuta apurada para ouvi-los para além do discurso científico-utilitarista que transforma qualquer relato de vida em mero apêndice teórico. Fazendo surgir relatos de 30, 50, 60 anos de vida cheia de mitos, de incertezas, valores, temporalidades, e muita vida plena. Assim, os mitos relatados pelos seringueiros se misturam às suas vidas, aparecendo nas noites escuras e acompanhando-os a vida inteira. É inebriante ver que a trajetória de vida de cada seringueiro, muitas vezes solitário, vivendo no meio da floresta densa, úmida, e muito quente, com uma poronga na cabeça, uma velha cartucheira nos ombros, uma faca de seringa, nos remete a todas as grandes obras épicas ou trágicas da literatura.