Este livro, ao investigar a relação entre paideia e retórica no século IV a partir da análise de como Gregório de Nazianzo fabrica a anti-imagem do imperador Juliano, apresenta méritos inegáveis. Em primeiro lugar, o fato de explorar uma documentação extremamente rica, como são as inventivas Contra Juliano. Como salienta a autora, poucos são os trabalhos que se voltam para a reflexão em torno do pensamento político de Gregório, priorizando antes os aspectos teológicos de sua obra, procedimento que não faz justiça à contribuição intelectual do bispo de Nazianzo para a sociedade de seu tempo. Por outro lado, a autora opta por não tratar as inventivas tão-somente como panfletos de ocasião destinados a depreciar a imagem de Juliano, sustentando que elas constituem autênticos tratados políticos na medida em que transmitem as idéias de Gregório acerca da própria função da realeza e dos direitos e deveres do imperador, inclusive em âmbito religioso. Como anti-panegíricos de Juliano, as inventivas encerram, nas entrelinhas, o modelo de princeps ideal para os cristãos, o que amplia sobremaneira a importân¬cia dessa documentação para o debate político travado à época. De modo ousado e admirável, a autora empreende uma leitura das inventivas Contra Juliano à luz do manual de retórica de Hermógenes, um escritor do século II, evidenciando a importância do conhecimento da retórica clássica por parte dos autores cristãos, o que vem a corroborar a hipótese da permeabilidade entre as culturas pagã e cristã na Antigüidade. Com isso, a autora contribui para desfazer certo preconceito que ainda vigora nos meios acadêmicos contra a retórica do Baixo Império, considerada por muitos uma expressão literária menor, desprovida de originalidade. Por todos os motivos aqui descritos, a obra de Margarida Maria de Carvalho é leitura indispensável para aqueles que desejam conhecer um pouco mais acerca das conexões entre política, religião e cultura na fase final do Império Romano. Gilvan Ventura da Silva Departamento de História - UFES