Helio Brasil assume sem nenhum disfarce uma perspectiva realista na descrição de personagens e cenários, talvez influência do seu fazer profissional como arquiteto que é. Assim, suas novelas são montagens estruturadas, com distribuição racional dos tempos e espaços da trama. Porém, há muito mais que isso, como, por exemplo, a densidade emocional dos protagonistas e a indicação precisa de que quem são, de onde vêm e o mistério de seus destinos, quase sempre essa a motivação das histórias. Um mecânico bêbado tropeça na subida viscosa e mergulha os joelhos na vala, tentando enfrentar a escuridão e a náusea ao som da telenovela que ressoa pelos casebres vizinhos; o arquiteto curioso que se esgueira entre as imagens da igreja barroca e é surpreendido pela visão de uma estranha cerimônia; e ainda a ansiedade da esposa solitária que corre para a porta, por onde entra o vendedor de livros; o rapaz sorrateiro nas transversais e becos, mão no gatilho, pensando na mãe e na irmãzinha, disposto a dar um arranco maior na vida; o velho cirurgião que, enquanto aguarda os amigos e um grupo de mulheres contratadas para um bacanal no sítio, escorrega seus olhos pelas colinas que se esfumam azuladas, a um passo do fim; as recomendações e os olhos negros da viscondessa que invadem a alma do jovem desenhista; e no último texto, o capuz do prisioneiro e o quase nada que ele alcança enxergar nas sessões de tortura. Seja lá do gênero que for, cada uma das cinco novelas (ou contos?) desse pentagrama confirma a qualidade da narrativa de Helio Brasil, que de acidental nada tem. São antes o resultado de um escritor que mostra o amadurecimento da sua arte. Mesmo na dúvida quanto ao gênero, podemos afirmar que este livro de Helio Brasil faz parte do que melhor se escreve na literatura brasileira contemporânea.