Projetada e inaugurada nas primeiras décadas do século XX, a Penitenciária do Estado de São Paulo, no bairro do Carandiru, foi não só o mais moderno presídio construído no Brasil, como um importante cartão postal da metrópole paulistana. Berço do Direito Positivo, cenário para a aplicação dos "mais avançados conceitos de regeneração de condenados", a instituição carcerária maravilhava os inúmeros visitantes locais e estrangeiros, inclusive aqueles que vinham a São Paulo somente para conhecer a Penitenciária. De Lévi-Strauss às mais eminentes autoridades jurídicas italianas, todos ficavam perplexos ao visitar a prisão. Em 1936, 16 anos depois de inaugurado o presídio, o famoso escritor judeu-vienense Stefan Zweig, amigo pessoal de Sigmund Freud, escreveu em livro sua impressão sobre o Complexo do Carandiru, equipado com escolas de arte, academias de música, pátios de ginástica, padarias, cozinhas, grande biblioteca, jardins, hortas, salas de banho com banheiras, e muitas oficinas de trabalho. Mesmo escondendo atrás de suas imponentes muralhas histórias de abomináveis violências, sofrimento, mortes, humilhação e tortura, a Penitenciária do Estado foi o último símbolo de uma época em que a questão prisional ocupava lugar de destaque na agenda política nacional. Hoje, aos 90 anos, transformada em unidade especificamente feminina, a velha cadeia ainda é o maior presídio da América Latina. Para as suas cerca de 2.700 prisioneiras, entretanto, a realidade é trágica. Reinventada, sem memória, cinzenta, arruinada a e sombria, a antiga Penitenciária do Estado é um triste monumento à falência do sistema penitenciário paulista e nacional. Espécie de esfinge diabólica que devora implacavelmente não só seus decifradores e não decifradores, mas todos aqueles que ousam chegar perto dela.