Toda a especulação cabalística adquire sua força a partir de dois textos: o início dos livros do Gênese (maassé berechit) e de Ezequiel (maassé mercaba), isto é, o texto que estamos examinando. A tradição esotérica lhe deu a importância extrema de resumir em algumas linhas os maiores mistérios. Por conseguinte, parece menos surpreendente colocar nosso comer o Livro como chave dos tiros alimentares judeus. Além disso, o texto de Ezequiel tem o mérito de fornecer novas significações a esse mecanismo fantasmático fundamental. Ele encerra uma primeira etapa da visão, em que o profeta não fala. Depois, uma voz, a do Pai com certeza, ressoa e quebra a fascinação: "Come esse livro e vai falar...". A incorporação do Livro, rito iniciático, revela-se prévia indispensável para que o "filho do homem" possa falar. Se a Bíblia representa o lugar onde emerge e se constitui a relação do homem com o significante, seus episódios tornam-se a metáfora dos momentos principais em casa sujeito você e eu se constitui daí a impressão profunda sentida pelo leitor da Bíblia, para além de suas origens e convicções. Os dois tempos da maassé mercaba nos dariam o segredo da história de cada um, primeiramente infans, submetido à linguagem decerto, mas ainda não capaz de falar, depois adquirindo a fala. Comer o Livro torna-se o mecanismo pelo qual a criança adquire sua língua.