A poesia de Rudnei Borges, ela mesma encharcada, lodosa, intumescida pelo barro que sujou seus pés de criança, construida como as casas de taipa de sua vida de interiorano na Amazônia, é surpreendente e avassaladora. Nela, a palavra, como matéria viva dessa transfiguração em permanente metamorfose, não nos deixa respirar, como se estivéssemos tomados por ela. Se é verdade que somos seres de linguagem e que isso nos diferencia de nossos outros companheiros animais, então este livro nos mostra toda a intensidade vivificadora representada pela palavra feita poesia. Num mundo arruinado, as palavras e sua infinita possibilidade de significação não são a cura, mas são o bálsamo. Elas nos devolvem a nós mesmos, não para nos tornar necessariamente melhores ou para fazer esquecer nossas dores, mas para que, quem sabe, nos deixemos levar por elas, como se fossem um rio caudaloso, que simplesmente corre em direção a sua foz, sem que nenhuma barragem o impeça.