A respiração implica em sensações olfativas involuntárias. Assim, ao respirarmos, necessariamente sentimos cheiros que podem remeter ao passado, ao que desejamos no futuro ou simplesmente, cheiros inéditos, que marcam tão somente o momento presente. A recordação tem um valor intenso para o homem até mesmo para sua constituição enquanto indivíduo e membro de um grupo. O homem guarda em si a necessidade constante da reconstituição de seu passado. O insuportável mau cheiro da memória. Eis do que sofrem as duas pacientes que inspiraram este livro. Se para alguns existem aqueles aromas fugazes, deliciosos, dos quais as pessoas tentam lembrar-se na tentativa de reproduzir o prazer que proporcionam, para outros, há apenas o insuportável mau cheiro da memória, do qual tentam livrar-se, para libertarem-se do desprazer e da dor por ele despertados. Da. Bernarda sente aquele cheiro de borracha queimada, que lembra o pneu da Kombi derrapada, causa do acidente que matou sua filha. E Leila, que passa mal com o cheiro de um produto de limpeza, que faz lembrar o formicida com o qual sua mãe se matou.